Disfunção Sexual: O que é, Classificação e Quem Atinge
24/11/2020Transtorno de Ansiedade Generalizada: O que é, Diagnóstico e Tratamento
02/12/2020O que é Terapia Sexual?
A terapia sexual é um ramo relativamente novo da psicologia clínica. Apesar de voltada prioritariamente para o tratamento das disfunções sexuais, ela pode ser conceituada como uma forma mais específica de terapia de casal.
Como o funcionamento sexual é complexo, o terapeuta sexual precisa estar preparado para lidar com aspectos individuais, interpessoais e ambientais. Necessita também estar atualizado sobre o impacto de tratamento dos fatores orgânicos das disfunções sexuais.
O conhecimento dos aspectos biológicos avançou mais rapidamente que a compreensão psicológica da função sexual. Desde o final do século XX ocorreu a “medicalização” dos tratamentos dessa área. Foram desenvolvidos novos métodos de exame e de tratamento. Exemplos são os inibidores da fosfodiesterase utilizados para a disfunção erétil e o emprego dos inibidores da recaptação da serotonina para controle da ejaculação precoce. Existe hoje uma compreensão maior das influências hormonais na qualidade da função sexual masculina e feminina.
Apesar desses sucessos, ainda existe espaço para as intervenções psicológicas das disfunções sexuais. A compreensão e as abordagens biológicas da sexualidade feminina não foi tão bem sucedia como os avanços ocorridos em relação à sexualidade masculina. E a interação dos aspectos biológicos com os psicológicos mesmo ainda sendo pouco compreendida, certamente é o fator principal na manutenção das disfunções sexuais.
As Causas das Disfunções Sexuais
As causas das disfunções sexuais são divididas tradicionalmente em causas orgânicas e psicológicas. Essa separação, entretanto, é artificial, porque as causas das disfunções sexuais são complementares e não excludentes. A atuação de fatores puramente orgânicos ou psicológicos é exceção e não a regra. Na verdade, eles podem ser vistos como pontos extremos de um continuum de causalidade das disfunções sexuais.
Modelo de Diátese-Estresse
As disfunções sexuais podem ser compreendidas como resultado da interação entre fatores predisponentes de vulnerabilidade e o estresse resultado por experiências de vida negativas atuais. As causas psicológicas e as orgânicas podem funcionar tanto como fatores predisponentes, precipitantes e de manutenção. Fatores orgânicos e psicológicos podem perturbar todos os pontos da atividade sexual.
Os Fatores de Risco Orgânicos
Os fatores de risco e as causas biológicas são estudados pela medicina sexual. Entre eles encontram-se, para homens e mulheres, as doenças cardiovasculares, diabetes mellitus, hipertensão arterial, doenças crônicas em geral, problemas genito-urinários, cirurgias do sistema reprodutivo, traumas físicos e sedentarismo.
Diversos medicamentos podem afetar a função sexual. Destacando-se os anti-hipertensivos e os antidepressivos. O abuso de substâncias também pode ser prejudicial. Sendo o álcool e o tabaco frequentemente implicados. As alterações hormonais precisam também ser consideradas. Entre elas destacam-se a diminuição dos níveis de androgênios e estrógenos e o aumento dos níveis da prolactina sanguínea.
As disfunções sexuais podem ser entendidas como marcadores de decréscimos da saúde em geral. Por exemplo, a disfunção erétil é reconhecida como fator predisponente para doenças silenciosas cardiovasculares. Ela já foi implicada como fator de risco isolado para infarto agudo de miocárdio e acidentes vascular cerebral.
Os fatores de Risco Psicológicos
Traumas
Os fatores psicológicos predisponentes já identificados são atraso do desenvolvimento na infância, perturbações no relacionamento familiar, educação sexual inadequada, dificuldades conjugais e qualquer experiência precoce traumática. Episódios de abuso sexual prévios e relacionamentos abusivos na infância também são os mais frequentemente citados. Esses dados aparentam embasar a formação de esquemas disfuncionais na infância, que na via adulta mediariam o aparecimentos dos sintomas sexuais conjuntamente com os fatores biológicos presentes.
Saúde Emocional
Esses mesmos fatores de risco psicológicos para as disfunções sexuais estão também associados com diversos problemas da saúde emocional em geral. Existe a possibilidades de efeitos cumulativos, porque a depressão e os transtornos de ansiedade, assim como os medicamentos empregados para seus tratamentos, são todos fatores de risco independentes para dificuldades na esfera sexual.
Aspectos Conjugais e Financeiros
Além dos predisponentes, aspectos psicológicos desencadeadores de disfunções sexuais também são estudados. Os conflitos conjugais merecem destaque, mas foram implicados a presença de expectativas não realistas da atividade sexual, reações negativas a presença de fatores orgânicos ou falhas sexuais eventuais e o nascimento de filhos. Muitos desses fatores desencadeadores funcionam como fatores de manutenção. Mas alguns ainda não citados também são importantes.
Dificuldades financeiras e desemprego dificultam a função sexual, podendo dificultar a libido, a excitação e o clímax. Fatores psicológicos específicos identificados na manutenção das disfunções sexuais são dificuldades de comunicação entre o casal, presença de ressentimentos no relacionamento e a ansiedade de desempenho.
Histórico da Terapia Sexual
Surgimento
Os estigmas e preconceitos dificultam o tratamento das disfunções sexuais. O final do século XIX testemunhou o aparecimento da medicina moderna. Mas é dessa época a concepção dos problemas sexuais serem vistos como resultado de deficiências de caráter. A terminologia deste pode servir como evidência. Dessa época é a denominação da disfunção erétil como impotência sexual e de frigidez as dificuldades sexuais femininas.
O aparecimento da psicanálise representou grande progresso na desmistificação da importância da vida sexual desde a infância até a vida adulta. Muitos problemas psicológicos passaram a ser vistos como dificuldades da expressão da libido. Mesmo assim, as próprias disfunções sexuais não receberam a atenção necessária. Elas foram consideradas secundárias aos problemas de ansiedade resultantes de conflitos inconscientes primários.
A terapia comportamental emergente deu maior atenção às disfunções sexuais propriamente ditas por ter uma maior preocupação com os sintomas observáveis dos transtornos emocionais. Mas as dificuldades sexuais continuaram a ser vistas como manifestações psicossomáticas da ansiedade patológica. Como a ansiedade pode inibir reciprocamente a excitação sexual, foram desenvolvidos tratamentos de exposição e de dessensibilização para algumas disfunções sexuais.
Quando ocorreram avanços?
A grande revolução e o aparecimento da terapia sexual moderna foi resultado dos estudos de Master e Johnson desenvolvidos a partir de 1970. Eles providenciaram as primeiras observações empíricas do funcionamento sexual humano. A importância da fisiologia da atividade sexual resultou melhor compreendida.
Eles apresentaram o sexo como uma habilidade a ser aprendida por homens e mulheres e não como um comportamento espontâneo natural. O foco do tratamento voltou-se para a satisfação pessoal e não para o atendimento de expectativas quantitativas idealizadas de desempenho sexual. Os indivíduos são considerados responsáveis pelas suas vidas sexuais e orientados a estabelecer uma comunicação assertiva de suas necessidades com seus parceiros.
Foram desenvolvidas as técnicas modernas da terapia sexual, muitas adaptadas da terapia comportamental. Elas focalizam a redução da ansiedade no contexto sexual. Por exemplo, o método de “proibição do coito” seguido de exercícios progressivos de “focalização sensorial” tem semelhanças com as técnicas de dessensibilização sistemática in vivo.
Limitações ainda presentes
A terapia sexual moderna compartilha essas visões e continua aplicando adaptações das técnicas desenvolvidos por Masters e Johnson. Mas limitações importantes permanecem. As expectativas das taxas de sucesso dos tratamentos não foram atendidas, podendo ser considerados apenas como moderados. A ausência de um parceiro fixo ainda dificultas a implementação das intervenções propostas. Mesmo na população com parceiros fixos, o papel dos conflitos maritais permaneceu pouco atendido. E os problemas específicos da população, população homossexual, transgéneros e de minorias étnicas também foram pouco estudados. Sendo assim, permanece a possibilidade de importante papel a ser desenvolvidos por abordagens psicológicas inovadoras para as disfunções sexuais.
Como a Terapia Cognitiva pode auxiliar?
As terapias cognitivas-comportamentais fazem parte da revolução cognitiva e tem grande impacto na compreensão dos transtornos emocionais. A partir de suas formulações, foram desenvolvidos tratamentos comprovados empiricamente e de primeira escolha para diversos problemas. A terapia cognitivo-comportamental demonstrou eficácia no tratamento da depressão, pânico, fobia social, transtornos alimentares, problemas somáticos e insônia crônica entre outros.
Contribuição da Terapia Cognitiva nas Dificuldades Conjugais
A terapia cognitiva resultou em importantes inovações bem sucedidas na abordagem das dificuldades conjugais e de relacionamento afetivo. O papel dos pensamentos automáticos, crenças e esquemas, por trás de interpretações disfuncionais sobre as atitudes e comportamentos dos parceiros, é importante na manutenção dessas dificuldades.
Os impactos dos conflitos conjugais e as repercussões das disfunções sexuais nem sempre são facilmente distinguíveis. Isso porque podem ocorrer interações recíprocas e postula-se um papel das crenças disfuncionais na manutenção de ambos os problemas. Grande é o número de casais que se queixam de uma insatisfação global de relacionamento. Queixas relacionadas com expectativas quanto à disposição para frequência ou qualidade das relações sexuais também são comuns. E a interpretação que uma disfunção sexual pode ser a expressão de algum problema maior, silencioso, de relacionamento, realça a importância de se atentar concomitantemente para as dificuldades de relacionamento e da atividade sexual.
A Terapia Cognitiva e Os Problemas Sexuais
Além disso, muitos profissionais entendem que a terapia cognitivo-comportamental pode contribuir para a compreensão das disfunções sexuais propriamente ditas. O modelo cognitivo tem poder explanatório em relação aos fatores de manutenção dos problemas sexuais específicos e suas consequências. Mas ainda é limitado o número de estudos sobre o modelo e a efetividade dos tratamentos cognitivos para os mesmos.
Este é um campo de atuação inovador e em grande evolução. O terapeuta cognitivo-comportamental competente no tratamento das disfunções sexuais necessita então estar preparado para utilizar estratégias e técnicas voltadas para as dificuldades de relacionamento, para as dificuldades compartilhadas das dificuldades sexuais e para as disfunções sexuais específicas. Felizmente já existem modelos cognitivos para orientar o profissional em todas essas situações.
Salmo Zugman
Diretor do Instituto de Terapias Cognitivas – IPTC
Médico Psiquiatra – ABP
Terapeuta Cognitivo-Comportamental – FBTC